quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Pula!!!

O menino não tinha o que fazer, nem o que desejar. As condições de sua existência o propiciava um enorme ócio motor e aspirativo. Ir a escola parecia inútil (e era), exceto pela possibilidade de ter uma refeição “regular”. Diversão era andar nas ruas do centro com os amigos. Sujos e mal vestidos tinham como pináculo de suas aventuras diárias, pular no rio, da beira do cais, na principal praça da cidade.
Como era bom!
A emoção do salto, o ressurgir na superfície da água, a platéia de turistas que se formava, as fotos...
Eles geralmente chegavam as 3 da tarde, não que marcassem, mas o horário era quase sempre o mesmo. Saltavam até o por do sol, ou até os meninos mais velhos resolverem ir para casa. A lei era do mais velho e mais forte.
Ele sempre sentia medo nos primeiros pulos do dia. Sabia que não morreria afogado, pois nasceu com o umbigo enlaçado em volta do pescoço e fora adicionado o nome José ao seu nome de chamar. Isso o salvaria com certeza, mesmo assim sentia medo, mesmo com a experiência de vários outros saltos. Era sempre o ultimo a se jogar na água, daquela vez não seria diferente.
Todos já estavam na água, houve um show de flecheiros e saltos-mortais, mas faltava o dele. Enquanto tomava coragem para se jogar na água, ele achara um coco, que já devia estar no lixo. Seu olhar foi do coco a água e da água ao coco uma centena de vezes, até ele ouvir ser chamado pelos outros, de uma forma mais humilhante que inspiradora.
- Pula mulherzinha! – Ele apenas chutou o coco para um lado.
- Pula medroso! – Chutou o coco para o outro lado, como um jogador de futebol a driblar.
Fora sete chutes ao todo, sete chutes no coco para lhe trazer o animo para saltar. Então ele o fez, um salto acanhado, sem nenhuma acrobacia, mas saltou. Naquela tarde, seus pés perfuraram a água muitas outras vezes, até que o céu começou a mudar de azul para o laranja e todos entraram no consenso de voltar para casa.
Já na rua de sua casa, no seio da favela, seu amigo mais próximo perguntou:
- Vai amanha?
- Não, amanha é quinta. – Respondeu aos suspiros de satisfação.
Quinta-feira distribuíam cachorro-quente na merenda da escola, ele lembrara, e sempre o deixavam comer mais de um.
Como era bom!

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