sábado, 28 de novembro de 2009

Shāh Māt

Eram 03:47 quando resolvi isso. 03:47 da madrugada. Nem sei o que estava fazendo acordado aquela hora, levando em consideração minhas obrigações no dia seguinte. O tempo gasto em apenas um pensamento que me atormentou nos últimos meses.

A defesa primaria, como de praxe, foi a fuga. Não pensar naquilo, pensar em outras coisas, ler, ouvir musica e esconder tudo que trouxe a tona aquele desejo. Ficava tudo muito tranqüilo. Até que batinha um nordeste mais frio, ou sudoeste mais quente e tudo vinha a tona de uma só vez.

Essa foi a rotina de alguns muitos meses recentes. Toda via, as 03:47 daquela madrugada resolvi mudar a posição de uma torre, avançar uns peões, cruzar os bispos e retroceder os cavalos. Qual minha surpresa quando vi a posição em que me encontrava. Rainha branca em posição desfavorável, apenas com as opções de sair do jogo ou abrir espaço para Xeque Mate contra seu Rei. Alem de dois peões meus a uma casa de se tornarem novas Rainhas Pretas.

Um lance para destruir a Rainha e outro para o cheque, mas para que a pressa? Acreditei que deveria sair tirando peça por peça do meu campo rival. Aproveitar cada alegria, cada ferroada ao rival. Devorando peça por peça sem desmanchar a armadilha que rendia a vitória certa.

Pus-me a me banquetear no desespero que surgia do outro lado do tabuleiro até o momento em que a compaixão se fez necessária. Um lance e o fim do jogo. Um lance para a vitória. Olhei bem fundo nos olhos do meu rival e disse solene:


- Fim do Jogo! Temos um empate.


Li a mistura de desespero e atordoamento em seu rosto, como se ele fosse um letreiro luminoso piscando em néon. Então venho a sensação:


- Venci.


Um minuto depois olhei para o relógio. Me dando as boas vindas ao jogo novo. As 03:47 daquela madrugada me dei conta do fim daquele jogo com o empate mais vitorioso que tive na historia. Respirei fundo e preparei o tabuleiro para o novo jogo e percebi a necessidade de outros adversários e aliados.

Munido de tudo que preciso para ir em frente, eu fui. O mundo me esperava de braços abertos, como quem sentia um falta enorme de mim. Fiz o primeiro movimento das peças e sensação do novo jogo me tomou as pontas dos dedos.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Depois de Março

Em algum momento de dois anos para cá eu envelheci. Não sei o dia exato, sei que foi nesse período.
Certa manhã acordei e me olhei no espelho, continuava com meus vinte e poucos anos e minha cara de quem tem menos de dezoito. Penteei-me com se tivesse quinze e sai para o mundo. Então comecei a perceber que as coisas ficaram mais estremas. O certo parecia muito certo. O errado muito errado.
Com o passar dos dias, meu sorriso, já raro naqueles tempos, foi aparecendo menos até se tornar um simples sobre erguer de um dos cantos da boca. Geralmente o esquerdo (por ser o lado coração?).
Olhava-me e olhava, mas nada tinha mudado fisicamente. Nenhuma ruga nova, nem um fio de cabelo branco. No entanto, a velhice era imperativa nas minhas ações e pensamentos.
Procurei esconder tudo isso na mascara de menino que já usava. Falhei! Dia-a-dia a faceta de menino-velho era mais exposta. Olhos ainda mais foscos e frios. Decisões mais definitivas e pensadas cada vez mais rápido. Menos dó, receio e duvidas. Mais certezas e determinações.
Penso se posso algum dia ir a resgate da juventude e infância que se perderam nesses dias. Penso, mas não ajo para que possa resgatá-las. Penso e só existo.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

O que é um copo de paixão para um embriagado de amor?


O coração é um cofre, um baú e como tal gosta de estar cheio, busca por ser preenchido. Mesmo com seu fecho danificado, com a porta emperrada, não é esforço para um coração se abrir para um novo sentimento. A razão condena, a mente distancia, porem nenhum outro músculo é tão forte.

Por ser músculo o coração segue instintos, mas é suficiente sábio, sábio o bastante para saber que dor de amor não se cura com ódio, rancor ou medo, mas sim com prazer de amor. A sabedoria do coração nos diz que não se perde o amor, se perde um amante, e que na próxima troca de olhares brilhantes, nas próximas risadas, nas duplas de cantores de “na-na-ná”, vamos pensar que ele esta sendo preenchido novamente, mas que nada, isso é prova de que ele já se preencheu.

Amor é como gás, a menor quantidade que seja ocupa todo o espaço que o concederem. Ele vai se expandindo, esticando, mas se recusa a contrair para dar entrada a outros gases iguais a ele. Porem existem gases diferentes, existem amores diferentes, que se unirão para formar um novo gás ou não se misturarão devido a densidades distintas, todavia convivem em plena harmonia.

O coração bate para deixar o amor em movimento e o corpo usa isso em beneficio próprio no transporte do sangue. É como a manivela da panela de pipoca, tem que se fazer todo o milho estourar e temos, para isso, que trazer alguns grãos para perto do calor.

Amor nunca é mais amor, nem menos amor; é amor e ponto. Ou é, ou não é. O brilho pode até entrar mais fundo nos olhos, porem sempre enquanto houver amor ele estará lá.